Artigo escrito por Frederico de Martins e Barros, Sócio-Diretor da Martins Barros Advogados
A celeuma em tela ocorre em razão de ocorrência do pagamento do vale-transporte por meio da folha de salários.
Ora, apesar de a Lei nº 7.418, de 1985, ter afastado a natureza salarial do vale-transporte, o Decreto nº 95.247, de 1987, que regulamentou a norma, vedou a substituição desse benefício por dinheiro. A única exceção seria para as situações em que ocorresse insuficiência de estoque do vale. A restrição imposta pela norma foi motivada em razão dos casos de empresas que pagavam parte do salário de seus empregados como se fosse destinado ao transporte, com o objetivo de recolher encargos fiscais mais baixos.
Todavia, a lei precitada deve ser interpretada em seu sentido teleológico e finalista. Ora, o pagamento em dinheiro destinado ao vale transporte, por uma, é benéfico ao trabalhador. Por duas, não se trata de uma simulação para encobrir o verdadeiro salário desse mesmo trabalhador.
Com relação ao enfoque normativo, deve predominar a previsão da Lei nº 7.418 que afastou a natureza salarial do vale transporte, em detrimento do Decreto nº 95.247, de 1987, que regulamentou a norma. Assim sendo, o decreto não pode modificar a natureza jurídica do pagamento de vale-transporte.
Como já dito, o vale transporte em dinheiro constitui benefício que o empregador antecipará ao trabalhador para utilização efetiva em despesas de deslocamento residência-trabalho e vice-versa.
A legislação trabalhista estabelece, através da Lei 7.418/85, que o vale-transporte concedido no que se refere à contribuição do empregador.
Por outro lado, embora a primeira vista a legislação estabeleça que o fornecimento do VT não nem natureza salarial e nem constitui remuneração para base de cálculo de INSS, FGTS ou IRF, a mesma deixa claro que é vedado ao empregador substituir o vale-transporte por antecipação em dinheiro ou qualquer outra forma de pagamento, salvo se houver falta ou insuficiência de estoque de vale-transporte (dos fornecedores), necessário ao atendimento da demanda e ao funcionamento do sistema.
Após várias discussões legais acerca da possibilidade de fornecer o Vale transporte em pecúnia, foi editada a Medida Provisória 280/2006 que passou a permitir, a partir de 01.02.2006, o pagamento do benefício em pecúnia (dinheiro).
Em 10 de março de 2010, o tribunal pleno do Supremo Tribunal Federal sepultou de vez a controvérsia quando, ao apreciar o RE (Recurso Extraordinário) 478410, sob relatoria do então ministro Eros Grau, concluiu que o valor pago em dinheiro, a título de vale-transporte, pelo empregador aos seus empregados não afeta o caráter indenizatório do benefício e que o art. 5º do Decreto n. 95.247/87 é inconstitucional por incompatibilidade com o sistema tributário da Constituição de 1988. Decidiu o STF ser inconstitucional a cobrança da contribuição previdenciária sobre o valor pago em dinheiro a título de vale-transporte.
Embora o pagamento em dinheiro acabe permitindo ao empregado dar destinação diversa à importância recebida a título de vale-transporte, como por exemplo, adquirir alimentos ou combustível para o veículo particular, o STF entendeu que a proibição legal para que o vale seja pago em dinheiro foi para evitar a fraude por dissimulação, ou seja, o pagamento em dinheiro dissimular salário, mas isso não autoriza admitir-se que o “instituto tenha mudado de natureza” (voto do Ministro Cezar Peluso no acórdão RE 478410/SP).
No ano de 2011, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) unificou sua jurisprudência e seguiu orientação do Supremo Tribunal Federal. Até então havia decisões do STJ que reconheciam a incidência da contribuição previdenciária sobre o benefício do vale-transporte quando pago em dinheiro.
As decisões da Justiça do Trabalho também trilham no mesmo caminho, qual seja, no sentido de que a substituição do vale-transporte por pagamento em espécie não tem o condão de transmudar a natureza jurídica do vale-transporte que, por disposição legal é indenizatória, já que o valor se destina a ressarcir os gastos do empregado com o deslocamento residência-trabalho e vice-versa.
Entretanto, deve-se ressalvar que, o TST tem entendido ser possível o pagamento do vale-transporte em dinheiro, caso exista tal previsão em instrumento normativo.
Assim sendo, aconselha-se constar em Convenção Coletiva do Trabalho ou em Acordo Coletivo de Trabalho essa permissão, para se evitar futura autuação por parte do Ministério da Economia.
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